quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Haicaístas do sul do país lançam livro


O escritor curitibano José Marins acaba de lançar a coletânea A Lâmpada e as Estrelas (Araucária Cultural, 2012), que reúne uma seleção de dez haicaístas do sul do país. Na entrevista abaixo, ele fala sobre o livro, o haicai regional do sul do país e o centenário de nascimento da haicaísta brasileira Helena Kolody (1912-2004) -- a pioneira nacional nesta modalidade poética:

Por Monica Martinez

1) Como surgiu a ideia do livro?
 Havia organizado uma coletânea de micronarrativas, A Brisa É Você, composta de dez autores e 200 contos. Os autores ficaram satisfeitos com os resultados obtidos, e me deu muito prazer em realizá-la. Organizei uma segunda coletânea, dessa vez de contos, Então, é isso?, com dez autores e 50 contos. Notei que havia chegado a um formato interessante. Como alguns poetas me cobravam uma coletânea de haicais e estamos no ano do centenário de nascimento da poeta Helena Kolody, pioneira do haicai brasileiro, pensei que era hora de organizar um livro em homenagem a ela. A coletânea é feita de dez autores e 200 poemas. Entretanto, os autores não seguem o estilo que consagrou Kolody como haicaísta paranaense, a coletânea é que presta essa homenagem trazendo na quarta capa e na página da dedicatória, a foto e o poema da autora querida. O título vem do haicai de Helena Kolody, Luz Interior:

O brilho da lâmpada,
no interior da morada,
empalidece as estrelas.

2) Trata-se de um coletivo curitibano? Os autores se encontram com regularidade?
 Sim e não. Alguns se encontram, outros não. Alguns são curitibanos, outro, como é o caso do notável trovador brasileiro, A. A. de Assis, reside em Maringá, no interior do Paraná.

3) Você vê uma unidade na produção dos haicaístas que participaram da obra?  
Não foi isso que busquei ao organizar a coletânea. Encontrei poetas que realizam o haicai que o seu grau de conhecimento, manejo técnico e crescimento como haicaístas lhe permitem fazer. Também não sei se algum deles se tornará um dia mais próximo do estilo tradicional brasileiro que é mais rente ao estilo tradicional japonês. Do mesmo jeito que temos ali um autor que já esteve junto às origens e hoje tem um haicai desgrudado disso. Não os julgo em sua produção, nem posso fazê-lo, não é da minha índole. Gosto do resultado final da coletânea, cada autor me ofereceu um número bastante suficiente de exemplares de seus poemas e escolhi os vinte que compuseram um painel variado, mas significativo. Posso responder por mim, eu tenho me mantido na linha tradicional, com a especificidade da minha poética. Mas, é bom que se acrescente, que a maioria dos autores teve seus haicais aprovados por Edson Kenji Iura e Francisco Handa, no Jornal Nippobrasil, no Nippak e no Caqui (seção Grafiti), e foram publicados por estes dois estudiosos.

4) Como você vê a produção de haicai no país hoje? 
 O haikai, ou haiku, é o poema mais difundido no mundo hoje. Em nosso país ele também está bastante popularizado. Porém, tenho visto inúmeros blogues, sites, páginas e páginas de poemas ditos “haikais” e ao ler vejo que não são nem mesmo haicais-livres. Já disse em outra entrevista que para mim só existe um haikai – o restante são estilos. No Japão também é assim. Mas não posso dizer que o haikai de Bashô e o de Issa são semelhantes; ou, que o haikai de Shiki seja parecido com o de Nempuku. Não o são. Aqui no Brasil não podemos dizer que o haikai de Franchetti guarde alguma parecença com o de Goga. Todavia, todos são haikais, e guardam a mesma estrutura, possuem o sentido que o haimi dá ao poema. Quanto à produção nacional, vejo progressos. Lamento que se publique pouco, que as grandes editoras não conheçam o haikai. Não temos expoentes. Temos ótimos haicaístas, cada qual com sua voz poética. Quando se fala em unidade, isto pode soar como uniformidade, o que contraria a própria natureza da poesia.

5) Como vê a produção de haicais no sul do país?
 Quando brinco dizendo que os haicais da coletâneas são “esses haicais aqui do sul”, quero me referir às vivências dos autores nessa geografia, quando dão uma ecologia aos seus kigo, temas e senso de observação da cena haicaística.

6) A Araucária Cultural investe na difusão do haicai no país? 
 Gostaria de ter essa visão otimista que você está me apresentando: investir na “difusão do haicai no país”. Talvez um dia, quem sabe, eu mude o meu nome de editor para Massao Ohno, esse sim um editor de haicai no Brasil (e da poesia em geral). A Araucária Cultural é um projeto sustentado por quem publica por ela. Temos como editar bem um livro a preços módicos. Mas nem sonhamos com uma distribuição nacional, a venda é feita pelos próprios autores. Trabalho simples, sem pretensões.

7) Por que escolheram homenagear Helena Kolody no livro? A seu ver, qual a importância dela para o haicai contemporâneo brasileiro?
Escrevi um longo e detalhado trabalho intitulado “Helena Kolody: pioneira do haicai”. Está publicado na Revista Brasileira de Haicai – Caqui, dirigida pelo Edson Kenji Iura.

Helena foi a primeira mulher a publicar haicais no Brasil, em seu primeiro livro Paisagem Interior, de 1941. Ela era amiga da paulista Fanny Luiza Duprè, que por sua vez era ligada aos haicaístas pioneiros, voltados à tradição japonesa. Não posso avaliar a repercussão nacional do trabalho haicaístico de Helena Kolody no Brasil, mas em particular no Paraná, foi enorme. Paulo Leminski a considerava grande poeta do haikai, a colônia japonesa do Paraná a reconheceu como tal e deu a ela o nome haicaístico de Hayka (Perfume da poesia). Temos alguns poetas que seguem o estilo kolodyano de fazer haicai, inclusive um deles frequenta o Grêmio Haicai Ipê. A importância de Helena Kolody é regional, e nos falta valorizar esses poetas que como puderam, com os recursos de que dispuseram, escreveram haicais inesquecíveis que ficarão para sempre.

Serviço
A Lâmpada e as Estrelas: Coletânea de Haicais
Organização: José Marins
Autores: A. A. de Assis, Alvaro Posselt, José Marins, Marilda Confortin, Rosalva Freitas Brüsch, Rosângela Jacinto, Sandra Benato, Sérgio Francisco Pichorim, Suzana Lyra Strapasson e Vanice Ferreira.
Editora: Araucária Cultural, 2012, 230 páginas. R$ 25 (já incluída a taxa dos correios). Contato: josemarins@gmail.com

Um comentário:

  1. Monica, gostei da entrevista, ela deixa em evidência as pessoas que gostam e escrevem haicais com os preceitos fundamentados nos escritores clássicos.

    Na copa da espatódia
    A profusão dos pássaros
    Anuncia a noite

    João Toloi


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