sexta-feira, 13 de maio de 2011

Livro traz haicais de Portugal

Ao abrir a caixa de correspondências hoje tive uma surpresa: um envelope A5 vindo de Portugal. Nele, o livro De Frente para o Mar – poesia haiku contemporânea, organizado pelo professor universitário, músico e poeta David Rodrigues, de Lisboa, e lançado pelo selo Palimage, de Coimbra.

A capa elegante, vermelho sobre negro, chama a atenção. Na hora do almoço, li o conteúdo do princípio ao fim. Descobrir o haicai feito hoje em Portugal é uma experiência encantadora.

Ela me lembrou da vez que fui participar de um congresso na Ilha da Madeira. Além da paisagem exuberante, recordo-me da sensação muito peculiar de se visitar um país do mesmo idioma. Há uma familiaridade gostosa, afinal várias palavras e hábitos são os mesmos. Vários, mas não todos. Assim, ocorre uma sensação de se estar em casa e, ao mesmo tempo, paradoxalmente, de se estar em uma deliciosa viagem. Qual o sentido da palavra nortada? E da expressão rasa à água? Algo como expresso pelo filósofo e crítico literário alemão Walter Benjamim (1892-1940) quando ele fala das duas famílias de narradores, representadas pelo camponês sedentário e pelo marinheiro comerciante.

Em pouco tempo, percebi que a emoção foi mais forte que a razão. Não importava desconhecer o significado desta ou daquela palavra. A experiência poética ultrapassava estes limites da linguagem e as imagens puras e cristalinas que haviam impressionado os dez autores desta antologia atravessavam o mar e me atingiam em cheio.

Tomo a liberdade de compartilhar uns poucos haicais da coletânia. Alguns são próximos dos haicais puristas japoneses, a moda de Bashô, como praticamos no Grêmio Haicai Ipê de São Paulo, com sua métrica precisa:

A escarpa agreste –
Malmequeres amarelos
Respirando o mar
Leonilda Alfarrobinha

pôr-do-sol no mar!
Só o olhar fica para cá
Do horizonte.
David Rodrigues

Anoitecer de Setembro:
Um casal abraçado
Na varanda
Yvete Centeno

Outros, libertos da métrica, flutuam como o do poeta Albano Martins, professor da Universidade Fernando Pessoa, do Porto:

Diz o vento
Ao mar: sem mim,
não podes voar
.

Ao terminar a leitura, fica o deslumbramento pela produção destes poetas portugueses que buscam a difícil arte de forjar em palavras o essencial, como pedem os haicais.

Por fim, lembrei-me que Benjamim falava que o sistema corporativo medieval contribuiu para a interpenetração das duas famílias narrativas, uma vez que o mestre sedentário e os aprendizes migrantes trabalhavam juntos na mesma oficina. Para o alemão, haviam sido os mestres artífices que haviam aperfeiçoado a arte da escrita. Fiquei a imaginar como seria uma mistura de haiku brasileiro e português contemporâneo, dos haikais de lá com os haicais de cá. Mas isto é conversa para outra hora, que agora vou reler este livro com a merecida calma, pois vale muito a pena!

Monica Martinez

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Noite de inverno

As luzes acesas
no prédio solitário --
Noite de inverno.

The lights still on
in the solitaire building --
Long night of winter.

Monica Martinez

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Início de outono

Um vento suave
e a chuva mansa de folhas --
Início de outono

A mild wind
and the gentle rain of leaves --
Early autumn

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Aves de arribação



Um vê invertido
apontado para o norte --
Aves de arribação?


A V reversed
pointing North in the sky -
Migratory birds?


(tradução livre da autora)


Making of
Estava indo para o trabalho quando ouvi um grasnado no céu. Ao olhar pela janela do carro, vi um vê desenhado acima de mim. Em plena São Paulo, no meio de uma rodovia coalhada de carros, o privilégio de ver a vida passando!

Monica Martinez

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Contemplação da lua de 2011

Retransmito o convite de Edson Yura, coordenador do Grêmio Haicai Ipê:

Haicaístas,

Durante o outono, quando a lua cheia surge de forma esplêndida, os japoneses
costumam admirá-la e aproveitam para compor poemetos conhecidos por haicai ou haiku, acompanhados de comida e bebida.

Para os poetas de haicai, a estação do outono tem um significado profundo, de grande introspecção. A lua de outono é um dos temas preferidos deste exercício poético.

A participação é aberta a todos os interessados. Não será cobrada entrada nem será exigida inscrição. Os poetas poderão, se quiserem, fazer uma doação espontânea de qualquer valor para o Templo Budista Busshinji.

Quando
18 de abril de 2011, segunda-feira, 19h30
Onde
Templo Busshinji
Rua São Joaquim, 285, São Paulo
(Próximo à estação de metrô São Joaquim)

Abraços,

Edson Kenji Iura
kakinet@gmail.com
www.kakinet.com/lua

Foto: Miguel Schincariol

A espetacular fotografia acima integra a FotoRetrospectiva 2010 - 6ª Mostra Anual de Fotojornalismo, exposição coletiva promovida pela Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos no Estado de São Paulo – ARFOC-SP que destaca acontecimentos que marcaram o ano.

Serviço
FotoRetrospectiva 2010 - 6ª Mostra Anual de Fotojornalismo da ARFOC-SP
Galeria do Conjunto Nacional - De 6 a 27 de abril – Entrada gratuita
Avenida Paulista, 2073 – Cerqueira César – São Paulo (SP)
De segunda a sábado, das 7 às 22 horas. Domingo e feriado, das 10 às 22h.
Mais informações: 011.3257.3991 – www.arfoc-sp.org.br

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Maritacas

Em plena algazarra
e nem surgiu a manhã...
Bando de maritacas!


Primeiro colocado na sessão de sekitai realizada na reunião do Grêmio Haicai Ipê realizada em 26 de março de 2011. Haicai de Monica Martinez.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A experiência pedagógica com o haicai

Professores brasileiros estão usando em sala de aula o haicai como uma ferramenta que possibilita despertar nos alunos a percepção de si mesmos e do seu entorno natural e social, aumentando a sensação de pertencimento ao tempo e espaço em que vivem.

É o caso do professor de geografia da rede pública da cidade de São Paulo, João Tolói, que trabalha em uma escola municipal de ensino fundamental localizada na periferia de São Paulo, onde, segundo ele, a cidade começa – a EMEF Professor José Bento de Assis, em São Miguel Paulista.

“Comecei a trabalhar com haicai em 2006, pois percebi se tratar de um instrumento pedagógico para incentivar os alunos a escrever poesia. Cheguei até ele após ler alguns livros de Matsuo Bashô e visitar o site Kakinet. Foi um gostar à primeira vista! Desde então, estudo, pratico, leio e, principalmente, levo o haicai para os meus alunos como uma atividade de letramento”, explica.

Para o professor, o haicai praticado dentro dos preceitos japoneses humaniza as pessoas. “As crianças que desenvolvem a sensibilidade para este tipo de poesia enxergam o mundo diferente, com mais ternura, e aceitam melhor os conflitos. Nestes últimos seis anos percebi que elas passaram a ter um olhar mais sensível para as pequenas coisas que as cercam e para o meio ambiente. E não ficam presas no emaranhado de formas macros que são submetidas em seu dia a dia, que não trazem muitos significados para elas.”

POESIAS ESCRITAS PELOS ALUNOS
Veja uma seleção de haicais de alunos atuais e ex-alunos do professor Tolói:

Chuva de verão –
Cai sobre o telhado
tirando meu sono.

Lucas Ferreira - 10 anos

Floresta desmatada –
O Bugio saltador
no solo seco.

João da Hora - 13 anos

Nas folhas novas
O jardim se renova –
É primavera!

Priscila Mota - 12 anos

Sabiá cantando
alunos fazendo prova –
Prestar atenção em quê?

Wellington da Silva - 12 anos

Cuidados da mãe –
Finalmente desabrochou
flores-de-maio!

Anderson Oliveira - 12 anos

Velhinha curvada
olha com esforço -
Flores do jacarandá.

Wesley S. Santos – 12 anos

Nas ruas paulistanas
o frio apressa os passos –
Azaléias floridas.

Everton Tolentino – 11anos

Sobre o pé de pêssego
a primeira flor chegou
É primavera!

Leticia Queiroz – 13 anos

Janela do barraco –
Os vasinhos das violetas
dão vida ao lugar.

Lucas Rozendo Silva – 13 anos

Janela do ônibus-
Por todo lado, flores...
Primavera chegou!

Gleyce Kelly R. Silva – 13 anos

Manhã de primavera -
O menino e o gato
caminham no parque

Bianca Samara – 12 anos

Vento frio chegou
Junto com o cachorro
querendo entrar.

Daniel de Matos Lopes – 11 anos

O vento frio -
O recreio da escola
sem brincadeiras.

Sabrina Dionisio – 11 anos

Flores do ipê-roxo
caem pela calçada-
O vento espalha

Priscila Carmo de Souza – 12 anos

Início das férias -
O céu ensolarado
fica cheio de pipas

Jonas da Silva Barros – 11 anos

Na sala de aula
só bagunça, lá fora...
O bem-te-vi canta

Denise Costa Moreira – 12 anos

Pipa no alto do céu –
O menino imagina
voar junto com ela

Larissa da Silva Ribeiro – 12 anos

Chuva de primavera
cai mansamente na rua –
Desejo estar nela

Renan Santos dos Anjos – 12 anos

Apoiadas na cerca
As alamandas floridas
Seguem toda divisa.

Amanda Teles – 13 anos

Manhã ensolarada –
O comentário das comadres. . .
Jasmins da praçinha

William Abreu – 13 anos

Beira do lago –
Coberto como tapete
lençol de hortênsias.

Nicolli Pedroso – 13 anos

Vento frio na estação–
Pessoas esperam caladas
esfregando as mãos.

Adriely dos Santos Lima – 11 anos